31 de maio de 2023


 Postagem 4.532

BEDIN V.I.P.

ADRIANO BEDIN

 

 Notícias da Televisão: OFICINA FUNDAMENTO E INICIAÇÃO DE UMA LINGUAGEM ...

Adriano BEDIN formou-se na Oficina De Atores Nilton Travesso em 2006. Integrante do GRUPO TAPA, desde 2007. Recentemente fez parte do elenco de “O Jardim das Cerejeiras”, em cartaz no Teatro Aliança Francesa.

Peças levam Freud ao palco e mostram relevância da psicanálise hoje

03/05/2023

Duas peças tratam dos últimos dias de Freud. O grupo Tapa montou “Freud e o Visitante“, com direção de Eduardo Tolentino de Araujo, em cartaz no teatro Aliança Francesa, em São Paulo. Elias Andreato dirigiu “A Última Sessão de Freud“, que terminou sua segunda temporada na capital paulista com grande sucesso, lotando a ultima apresentação antes de iniciar nova turnê nacional.

É certo que o interesse pela psicanálise vem crescendo, no Brasil e no mundo desde o aumento de patamar de sofrimento psíquico trazido pela covid, mas também pela crise gradativa que o modelo global de saúde mental, baseado em medicação e técnicas de treinamento, mostrou-se um sucesso apenas relativo.

As curvas de suicídio crescem;
A descoberta de novas e mais eficazes medicações diminuem;
O investimento comercial em pesquisa deslocou-se para as terapias genéticas e imunológicas;
A esperança na produção de tratamentos revolucionários, mais rápidos e diretos, declinou;
Assim como foram vencidas a exclusividade das patentes da farmacopeia psiquiátrica.
Os achados em neurociências mostraram uma certa decepção realista;
Assim como os patamares de eficiência das terapias cognitivo-comportamentais, cada vez mais diversas e cada vez mais próximas do enigmático “efeito placebo”.
É neste quadro geral de maior humildade e menor otimismo quanto à cura dos transtornos mentais, e no contexto onde a cultura aparentemente “enlouqueceu”, que a psicanálise ganhou nova repercussão junto ao público em geral.

Por isso é compreensível que a imagem do Freud para nosso tempo não seja mais a do cientista que debateu contra os preconceitos de sua época, mas a do idoso adoentado que reflete sobre a vida e a morte.

Freud e o Visitante
Em “Freud e o Visitante”, Freud (Brian Ross) recebe um estranho em sua casa durante o tempo no qual sua filha Anna (Anna Cecília Junqueira) foi levada para interrogatório pela polícia secreta de Hitler.

O evento realmente aconteceu e para muitos biógrafos foi decisivo para fazer Freud deixar Viena e fugir para a Inglaterra, onde veio a falecer um ano depois.

O texto foi adaptado do trabalho de Éric-Emmanuel Schmitt ganhando extrema atualidade ao colocar Freud diante do que se poderia chamar seu Outro.

Ou seja, o visitante, brilhantemente encenado por Adriano BEDIN, representa um conjunto de indeterminações que perseguem Freud, ao final de sua vida.

Seria ele um paciente que foge do hospício local?
Seria ele uma versão de Deus, ou pior do Diabo, que tal qual Mefistófeles vem perguntar o que afinal Freud queria com tudo isso?
Mas talvez todo o diálogo não passe de um sonho onde Freud se depara com sua própria perda de consciência e fala consigo mesmo, incluindo suas mais escondidas lembranças infantis, como se fosse outro.
Estaria ele sonhando, doente, delirante ou apenas demasiado angustiado a ponto de transformar um diálogo imaginário em uma experiência real, ainda que confusa?
Somos gradualmente levados a deslocar a pergunta sobre quem é o visitante, para de qual Freud se trata:

A pai de Anna
O cientista
O filósofo
Ou até mesmo a pessoa comum diante de sua finitude.
A lição aqui é clara e distinta: é preciso aumentar nossa incerteza sobre com quem estamos falando até o limite de que não somos senhores de nós mesmos e de nossas próprias identidades.

A Última Sessão de Freud
Em “A Última Sessão de Freud” estamos na mesma época, mas agora não mais na Berggasse 19 de Viena, mas na Maresfield Garden 20, onde até hoje funciona o Freud Museum em Londres.

Agora Freud, na pele de Odilon Wagner, encontra C.S. Lewis (Claudio Fontana) —professor em Oxford, crítico literário cristão, amigo de Tolkien, T.S. Eliot e Chesterton, escreveu “As Crônicas de Nárnia” além de trabalhos fundamentais sobre a história do amor no Ocidente.

No texto original de Mark St. Germain, inspirado no livro “Deus em Questão” de Armand Nicholi Jr., trata-se de um confronto entre um cientista ateu, ainda que devotado a alteridades (o inconsciente, o desejo, a morte) e um intelectual adepto da fé, ainda que investigador racionalista do amor, do luto e do sofrimento.

O debate é justo, limpo e honesto.

Há pontos para os dois lados, mas deixa um pouco de lado a inquietação de Freud com Lewis. Ou seja, por que alguém nascido numa família católica em Belfast, Irlanda do Norte, que se torna ateu convicto na juventude, se converteria novamente à religião na vida adulta? Sabe-se que a experiência da Primeira Guerra Mundial e a perda prematura da esposa tiveram uma importância fundamental nesta decisão.

O elemento comum, ainda que pouco discutido nas duas peças, é “Moisés e a Religião Monoteísta”, conjunto de três ensaios que Freud estava escrevendo à época da saída de Viena e chegada em Londres, onde ele discute as origens do judaísmo.

Nestes ensaios, considerado por muitos como o testamento de Freud, ele especula sobre a história e diferença entre verdade material e verdade psíquica, sobre a transmissão do trauma, sobre as origens de uma comunidade de destino a partir da alteridade (conforme a surpreendente hipótese de que Moisés era egípcio e não judeu).

A pergunta de Freud a Lewis —”por que você trocou a verdade por uma mentira insidiosa”— reverbera com o texto “O Futuro de uma Ilusão”, no qual Freud argumenta que a religião não é bem uma mentira ou apenas um erro, mas uma espécie de ilusão que permite que em dadas circunstâncias nós consigamos sobreviver psiquicamente ao peso da realidade.

Tudo se passa como se diante da visita de um estrangeiro insuportável, conhecido pela mistura entre incerteza, desconhecimento, desamparo e morte, que vimos em “Freud e o Visitante”, o criador da psicanálise procurasse reafirmar suas crenças debatendo com o ateu infiel C.S. Lewis em “A Última Sessão de Freud”.

Mas o verdadeiro enigma é:

Por que nossa época tão distante no tempo e no espaço, na cultura e na moralidade, recupera e insiste na importância de um diálogo deste tipo?
Um esboço de resposta pode ser delineado pelo fato de que a psicanálise situe-se, cada vez mais na aurora do século XXI, exatamente no intervalo entre ciência e filosofia, entre crítica da cultura e ideologia moral, entre método de cura dos sintomas e prática de linguagem capaz de tornar a vida mais interessante.

Por isso ela é também atacada tanto por aqueles que dividem o mundo entre ciência verdadeira e única ou a fé na pseudociência, quanto por aqueles que separam claramente ideologia e realidade, e ainda por aqueles que pensam que tudo que não tem métrica é poesia mentirosa.

Menos do que opor razão e irracionalidade, progresso e barbárie, civilização e trevas, a psicanálise parece sobreviver por testemunhar que, no palco da vida existe um mundo que ainda não está inteiramente conhecido e dominado.


Pesquisa:Internet

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