Postagem 724
BEDIN V.I.P.
SEGREGAÇÃO SOCIOESPACIAL: APONTAMENTOS SOBRE A
DINÂMICA RECENTE NA CIDADE DE CHAPECÓ/SC (1991 A 2010)
Mayling Vassoler BEDIN
Graduanda em Geografia pela UFFS, Campus Chapecó.
E-mail: may_bedin@hotmail.com
Ederson Nascimento
Professor Adjunto no curso de Geografia, UFFS, campus Chapecó.
E-mail: ederson.nascimento@uffs.edu.br
INTRODUÇÃO: SOBRE A SEGREGAÇÃO SOCIOESPACIAL URBANA
A segregação socioespacial é entendida neste trabalho como uma tendência de
separação de grupos e classes sociais no espaço urbano, causando à fragmentação social
do mesmo (CASTELLS, 2000; CORRÊA, 2013) e originando, a partir disso,
dificuldades de acesso a bens de consumo, a serviços e à própria cidade (CORRÊA,
2013; MARQUES, TORRES, 2005; PAVIANI, 1989). A fragmentação socioespacial
decorrente dessa separação de grupos diferentes no espaço urbano apresenta diferentes
graus de complexidade, que podem resultar em padrões (ou modelos) socioespaciais de
segregação. As áreas fragmentadas caracterizam-se pela forte homogeneidade social
interna e grande disparidade social externa, em termos de diferenças e de hierarquia.
Essa hierarquia pode ser explicada por fatores como uma política de classe associada à
elite e as classes que detêm o poder econômico e político. O jogo de forças entre
classes sociais na disputa pelo espaço pode ser explicada através da concepção de
cidade capitalista, em que esta é o local onde ocorrem processos sociais, entre eles a
acumulação de capital e a reprodução social (CORRÊA, 2004). Na disputa pela
apropriação do espaço urbano, as classes sociais são capazes de gerar três principais
tipos de segregação: a segregação imposta, a segregação induzida e a autossegregação.
A autossegregação diz respeito ao controle que a elite possui sobre a decisão de
habitar, ou seja, possuem capital suficiente para escolher a melhor localização para
ocupar, levando em consideração fatores como a acessibilidade aos locais com melhores
infraestrutura e os gastos envolvidos neste processo. A segregação induzida é aquela
que se aplica às classes que possuem opção de escolha sobre o local de habitação, mas
de forma restrita, o que vai depender do valor da terra e do imóvel, e a segregação
imposta, por sua vez, está associada às classes de baixa renda, que não tem opção de
escolha sobre o terreno que irá habitar (O’NEILL,1983; VILLAÇA, 1998).
Conforme menção anterior, o espaço fragmentado possui graus diversos de
complexidade, gerando padrões de segregação socioespacial. Os padrões mais
conhecidos apresentados pela literatura são o de Kohl, o de Burgess e o de Hoyt. São
construções teóricas de períodos temporais distintos, que carregam o nome de seus
elaboradores.
O modelo de Kohl apresenta a seguinte estrutura socioespacial: as elites
localizadas na área central da cidade, onde está localizada a melhor infraestrutura e
serviços, e os segmentos mais pobres ocupando as áreas periféricas. O modelo de
Burgess, por sua vez, apresenta o desenvolvimento da cidade a partir de zonas
concêntricas que partem do centro em direção as extremidades, numa estrutura social
inversa à do modelo de Kohl, com o status social dos grupos residentes aumentando em
relação ao distanciamento da área central. Assim, nesse modelo, os pobres ocupam a
área central e a elite as zonas concêntricas periféricas. O modelo de Hoyt é o que
apresenta uma maior complexidade. Desenvolvido a partir da lógica que a expansão
urbana e a segregação residencial se faziam ao longo de setores. Neste caso, os setores
ocupados pelas classes de alta renda acompanham eixos de circulação rápida, sem
empecilhos para a expansão urbana e dotados de amenidades naturais. (CORRÊA,
2013).
Segundo Côrrea (2013), os modelos apresentam estruturação e características
distintas, entretanto podem aparecer combinados entre si ou com predominância de um
sobre o outro em uma mesma cidade.
Na cidade de Chapecó, no Oeste Catarinense, a segregação socioespacial
apresentou inicialmente características espaciais relacionadas ao padrão de Kohl, ou
comumente chamada de padrão “centro x periferia”, onde a área central era habitada
pelas camadas de alta renda e as periferias longínquas e subequipadas sendo o destino
principal dos estratos menos favorecidos economicamente. Apesar desta característica
ser predominante ainda no espaço da cidade, é possível perceber o início de uma
alteração neste padrão socioespacial. Isto, porque novas atividades de consumo vem
sendo implantadas na cidade, influenciando diretamente em novas formas de habitação
e novas áreas destinadas para a elite, principalmente em função do surgimento de
condomínios residenciais fechados afastados da área central e da dispersão de favelas ao
longo do tecido urbano, principalmente associados à terrenos e áreas impróprias para
habitação ou vulneráveis do ponto de vista socioambiental.
OBJETIVOS E METODOLOGIA
O objetivo do presente trabalho é analisar as dinâmicas recentes da segregação
socioespacial na cidade de Chapecó. A pesquisa tem origem no desenvolvimento de um
projeto de iniciação cientifica intitulado “Expansão urbana e segregação socioespacial:
uma análise da cidade de Chapecó (SC)” desenvolvido no âmbito da Universidade
Federal da Fronteira Sul campus Chapecó. Os resultados apresentados neste trabalho
fazem parte do período final da pesquisa, onde os resultados apresentavam-se de forma
mais clara e estruturada. O processo metodológico envolveu o levantamentos de dados
bibliográficos sobre segregação socioespacial, desenvolvimento histórico e geográfico
do município e região, geoprocessamento, além de dados estatísticos dos Censos de
1991, 2000 e 2010 e dados cartográficos do município; construção de indicadores
socioespaciais e de bases de dados georreferenciados; construção de materiais
cartográficos; realização de trabalhos de campo, ressaltando a necessidade da relação
entre trabalho teórico e empírico na construção da pesquisa.
A SEGREGAÇÃO SOCIOESPACIAL EM CHAPECÓ (SC): PRINCIPAIS
CONDICIONANTES HISTÓRICO-GEOGRÁFICAS
O município de Chapecó possui uma população de cerca de 183,5 mil habitantes
(IBGE, 2010) e uma história e desenvolvimento estreitamente relacionada à economia
agroindustrial, a qual exerceu importante papel de agente produtor do espaço urbano
(ALBA, 2002; PERTILE, 2007; RECHE, SUGAI, 2008; WOLFF, 2008). A
implantação do setor agroindustrial na cidade e da imposição do sistema de integração
aos proprietários rurais ocasionou a migração de enormes contingentes populacionais
para a cidade de Chapecó, que, expulsos do campo por falta de capital para integrar-se
ao sistema e sem outros meios de subsistência, dirigiram-se para a área urbana em busca
de uma condição de vida melhor. Porém as constantes migrações vindas em sua maioria
das cidades vizinhas acarretaram em diversos problemas urbanos em Chapecó,
principalmente relacionados à falta de moradia destinada às camadas populares.
(ALBA, 2002; RECHE, SUGAI, 2008).
Para acirrar ainda mais as condições de segregação que já vinham se delineando
no espaço urbano chapecoense, o poder público do município no intuito de “solucionar”
os problemas de ordem urbana, acabam por favorecer as classes dominantes da cidade e
prejudicar ainda mais os desfavorecidos economicamente. O poder municipal promoveu
a legalização de espaços inadequados à habitação e realizou investimentos de forma
distinta no espaço, além de criar instituições para excluir os pobres da área central da
cidade, destinada ao convívio social da elite (WOLFF, 2008; HASS; AIDANA;
BADALOTTI, 2010). Todas estas ações culminaram na conformação de um espaço
urbano segregado socialmente, condição que perpetuou-se ao longo dos anos,
culminando na atual condição socioespacial da cidade, que vem apresentando alterações
significativas nas últimas décadas.
DINÂMICAS RECENTES DA SEGREGAÇÃO SOCIOESPACIAL EM
CHAPECÓ
A construção de indicadores sociodemográficos para Chapecó demonstrou que a
cidade apresenta ainda um padrão predominante de segregação socioespacial
denominado modelo de Kohl, ou, padrão clássico centro x periferia. Conforme
mencionado anteriormente, este padrão exprime a concentração de elites econômicas na
porção central da cidade, e das camadas de mais baixa renda nas áreas periféricas. Com
base em dados censitários de 1991 e 2000 referentes à renda de chefes de família,
notou-se uma discrepância em relação a ocupação do espaço por parte dos mesmos,
havendo uma concentração de responsáveis domiciliares com alta renda (Figura 1) e
com maior instrução na área central da cidade. Outro fator de destaque é a baixa taxa
demográfica nesta mesma porção do espaço, o que revela que além da alta concentração
de renda na área central, existe também uma concentração de terrenos, que, em sua
maioria, são ocupados para atividades comerciais, ou que são beneficiadas pela
legislação municipal que permite apenas uma ocupação habitacional com característica
de baixa concentração demográfica nestas áreas.
As áreas periféricas, por sua vez, apresentam altas taxas de densidade
demográfica e rendas de chefes de família mais baixas (Figura 2). Os trabalhos de
campo e a literatura também permitiram associar à periferia de Chapecó as piores
condições de infraestrutura, situação como a que pode ser visualizada na imagem
(Figura 3): casas em áreas de risco e sem saneamento básico ou qualquer outra
infraestrutura adequada. Estas situações precárias também refletem nas condições
sociais de seus habitantes, o que é explicado por Santos (1987) ao afirmar que o nível de
cidadania do indivíduo está diretamente relacionado ao ponto do território onde o
mesmo está, o que significa que as diferenças de acessibilidade que incluem (tempo,
preço, frequência) podem afastar ou aproximar os indivíduos de serviços e/ou
instituições, que lhe garantam mais cidadania, como: escolas, serviços de saúde, bens
indispensáveis à sobrevivência. Em Chapecó o bairro São Pedro, localizado na área
Leste da cidade, pode ser citado como exemplo de bairro periférico que persiste com
problemas sociais que tem origem ainda na sua criação (GOMES, 1998).
As alterações percebidas no espaço nas últimas décadas refletem as mudanças
que vem ocorrendo em Chapecó, fruto de novas disputas territoriais e que influenciam
diretamente nas condições de vida dos habitantes da cidade. Condomínios residenciais
fechados em áreas distantes da zona central e providas de amenidades naturais vêm
sendo a nova opção de habitação da elite chapecoense. Além disso, encontramos
também focos de favela dispersos no tecido urbano, alguns em bairros próximos à área
central principalmente nas margens de córregos (Figura 3), o que contaria a tendência
da concentração de pobreza restrita apenas as periferias longínquas. Vale destacar que
há uma tendência de ocupação de áreas vulneráveis (próximas à rios, encostas
declivosas, etc.) por parte da população que não tem acesso ao meio legal de habitação
ou que apesar de adquirir a terra por meio legal, a mesma encontra-se em área não
indicada para ocupação. Aliado a essa nova dinâmica, estão também a criação de novos
objetos geográficos de consumo que se materializam, como shoppings centers e
hipermercados que vêm se instalando na cidade e reconfigurando as centralidades
intraurbanas ao atrair para suas adjacências moradores de melhores condições
econômicas no âmbito da valorização espacial.
Pesquisa:Internet
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