1 de outubro de 2014

Postagem 269
CURIOSIDADE

TRECHO DO LIVRO STORIA DIMENTICADA (HISTORIA ESQUECIDA)
DE DELISO VILLA

GÊNOVA: OS MISTÉRIOS DO PORTO

Em agosto de 1894, um jovem sacerdote chegou à estação de Gênova, mandado por bispo Scalabrini . Não conhecia a cidade, não tinha um tostão no bolso. A missão que lhe havia sido confiada pelo bispo de Piacenza era simplesmente fazer o bem aos pobres emigrantes. Padre Maldotti, assim, chegou pela primeira vez à praça da estação, tomada por 2000 emigrantes.
É ele mesmo que nos conta:
O espetáculo era comovente e, por muitas razões, horripilante. Uma turba de gente suspeita (empregados de hotéis, subagentes de emigração verdadeiros ou improvisados) agitava-se entre aquele exército da miséria, arrastando à força as famílias daqueles desgraçados atrás de si, rumo a destinos desconhecidos. Eu não entendia nada, mas bem sei que o espetáculo não me divertia muito.
Um rapazola de Cremona, mas precisamente da Ilha Doverese, com um crachá amarelo dos nossos comitês de San Raffaele no chapéu, vem correndo a meu encontro com os braços estendidos para frente e pede ajuda, pois lhe haviam roubado a mulher , os filhos e uma certa sacola....! Não lhe perguntei mais nada, mas lancei-me à caça, junto com ele, em meio àquela confusão babélica, atingido nos ouvidos por gritos desarticulados, prantos e impropérios em quase todos os dialetos da Itália;  conseguimos com um esforço extremo, descobrir os infelizes, empurrados por um marginal, com a famosa sacola às costas, Deus sabe para onde.Travamos assim, muitos preâmbulos, uma luta bastante vivaz, em que, se recebi uma boa dose de socos, posso garantir também que os deferi, desesperadamente. A certa altura um senhor vestido de preto veio nos ajudar: agarrou o bandido pelo pescoço e o entregou a dois policiais.
Com aqueles pobres-diabos dirigi-me ao oratório de comitê e outras nove famílias seguiram-nos. Estando a salvo, começamos todos a chorar: eles de desespero; eu, de raiva. E eis que surge novamente o senhor de preto:
“Quem é o senhor?”
“Antes de mais nada “ respondi – “sou um cidadão livre. Depois, por graça de Deus, missionário , mandado para cá para fazer por esses pobres criaturas o que a polícia não sabe ou não pode fazer.
Por essa resposta, o distinto senhor atirou seus braços em meu pescoço.  Depois acrescentou: “No senhor as pessoas acreditarão. A mim, delegado de Segurança Pública, nunca deram ajuda nem em mim confiaram, lá em cima no Palazzo Ducale.
“Pois bem” – respondi – “combateremos juntos”. E combatemos verdadeiramente.
Para compreender o que acontecia em Gênova naqueles anos é necessário recorrer à lei da emigração promulgada pelo governo Crispi em 1888. É um exemplo clássico de um documento preparado com as melhores intenções pelos assim chamados “especialistas” que trabalham dentro das muradas dos ministérios e que, ao final, causam muitos aborrecimentos. Com aquela lei, na verdade, pretendia-se estabelecer a ordem entre os agentes de emigração que operavam em toda a Península fora de qualquer controle. Os especialistas pensaram, justamente, que a melhor coisa seria vincular o exercício dessa atividade à posse de uma habilitação, mais ou menos como se faz com as lojas ou com as atividades liberais.
A única condição  era o deposito de uma soma de dinheiro nos cofres do Estado.
Foi um desastre. Graças à habilitação, os agentes de emigração obtiveram de fato o reconhecimento oficial : Tornaram-se profissionais tutelados pela lei.  Em poucas semanas”os mais esplêndidos canalhas – ainda é Maldotti que está escrevendo – os desclassificados de todas as espécies, os analfabetos mais evidentes correram a engrossar o exército dos novos profissionais. Fortalecidos por seu inesperado direito, fizeram audaciosos a escalada a prefeituras e sub-prefeituras e obtiveram cerca de 20.000 habilitações, munidos das quais percorreram os campos fazendo uma propaganda legal . E a propaganda foi implacável, escandalosa. Alguns foram vistos nos vales da região Bergamo pregando em cima de carroças, vestidos excentricamente como saltim-bancos, nos mercados e nos cemitérios, discorrendo sobre as fortunas extraordinárias destinadas aquele que partissem para as Américas. Os fretes pagos pelo governo do Brasil foram uma benção para esses profissionais. Os 50.000 camponeses que antes emigravam eram agora 200.000 por ano. Apenas no porto de Gênova, de 1882 a 1894, partiu um milhão e meio de emigrantes, dos quais 719.000 dirigiam-se ao Brasil “.
Aquilo que aconteceu em Gênova era escandaloso e terrível . Cambistas que davam dinheiro falso ou exigiam taxas de agiotas. Preços de fretes triplicados. Taxas impostas (e embolsadas) até ao que tinham a viagem paga pelas autoridades brasileiras. Desconto ferroviários anulados (e sempre embolsados) com a desculpa de que se tratava de trem especiais...E as estradas, as portas das igrejas e dois edifícios públicos cheio de grupos de emigrantes desgraçados e famintos, semi nus, tremendo de frio, mesmo nas noites rígidas e chuvosas de inverno.
O que o missionário não conseguia entender era por que toda aquela gente infeliz chegava a Gênova cinco, seis e até dez dias antes da partida. E por que todos chegavam com um certo bilhete que carregavam no chapéu, com o endereço do hotel e o carimbo da agencia que os faria partir. Não lhe foi difícil encontrar a resposta. Uma vez que a lei (ainda a estranha lei de 1888) impunha aos agentes que cuidasse do emigrante até a partida, esses os faziam chegar vários dias antes e os abandonavam nas mãos dos hoteleiros, depois de, evidentemente, terem embolsados uma cifra correspondente a cada cliente providenciado .
A esta altura intervinham o taberneiro, o carregador, o mensageiro, os fabricantes de bebidas, os sub agentes, os cambistas ... E cada um exigia o sangue e a honra das vitimas , por que por sua vez, tinham que pagar uma outra turba de vampiros e de sub vampiros, grande e pequeno, que arrumavam os clientes. De modo que, a qualquer custo, das veias estéreis daqueles infelizes, deveria sair sangue e mais sangue para todos”.
O missionário armou um piquete na estação e, cada vez que chegava um trem, a primeira coisa que fazia era arrancar dos chapéu os endereços dos hotéis, provocando assim um balburdia indescritível entre os interessados, denunciando sem misericórdia ao delegado de segurança pública (o senhor Malnate, aquele do primeiro encontro) os culpados por abuso e trapaça, provocando protestos e contravenções quase todos os dias. Depois, com os emigrantes em batalhões cerrados, levando crianças e sacolas ou segurando velhos cambaleantes, alcançavam o porto , sempre lutando ao longo do trajeto com os canalhas que procuravam roubar alguma família. E ainda era necessário correr junto com o chefe de família, para conseguir a passagem , de uma agência a outra e desta para o navio.  “ não raras vezes a noite nos surpreendiam em jejum, por que não deixávamos os cais se antes não tivéssemos encontrados abrigo para cada um de nosso protegidos”
O  fato de que um padre, mesmo que amparado por um extraordinário inspetor de segurança, se opusesse as manobras dos exploradores tirava o sono de muitos.  Padre Maldotti ficou sob a mira desses homens e foi denunciado.
Houve encontro entre hoteleiros e recrutadores. Um protesto foi levado a prefeitura. Houve até ameaça de morte.
O missionário pensou que o melhor a fazer seria passar ao ataque. Fez publicar no jornal um título em letras grandes: Amanhã  desvendaremos os mistérios do porto de Gênova e a infame exploração dos emigrantes. Por vinte dias despejou documento e por vinte dias os jornais comoveram a cidade com a narração de baixeza espantosa.  Houve ameaças de querela: houve também muitos processos: mas quem pagou as despesas de tudo isso foram os exploradores, grande e pequeno, pego pela armadilha.
O prefeito foi transferido . D Roma , finalmente, chegou a esperada lei. As companhias de navegação e os agentes tinham agora a obrigação de chamar os emigrantes a Gênova apenas na véspera de sua partida: cabia a ele o ônus de alojá-los e de nutri-los gratuitamente até o momento do embarque. O missionário vencera.
Padre Maldotti também contribuiu para uma outra iniciativa importante a favor dos emigrantes: a criação de um abrigo para acolher o viajante a espera do embarque. O problema era grave por que as companhias mantinham os emigrantes nos navios, amontoados aos milhares, antes mesmos da vinda da inspeção sanitária , com perigo de se alastrassem epidemias durante a navegação. O navio Pará, durante uma viagem, teve 39 de seus passageiros mortos pelo sarampo... A lembrança ainda esta viva na memória de muitos.
O projeto de uma CASA DO EMIGRANTE , proposto anteriormente por bispo Scalabrini, avançou com dificuldade, em meio a entraves burocráticos e vários obstáculos . O missionários gostaria que tivesse sido o governo a assumir a iniciativa, com um serviço devido aquele que se preparavam para deixar o país , mais as resistências foram muitas. Chegou-se a 1904, quando explodiu um nova acontecimento:  O retorno a pátria de milhares e emigrantes, que ficaram sem condições de sobreviver na América do Sul . O missionário teve de renunciar aos seus projetos e a se dedicar a essa nova desventuras.
A história da missão do porto continua a ser, de qualquer maneira, exemplar. É a história de uma cidade e de uma nação, por muitos anos, assistem , indiferente, a um espetáculo revoltante: centenas de milhares de pessoas exploradas em modo sistemático com a cobertura da lei. Quem batalha pelos emigrantes é um padre: um daqueles padres extraordinários que o bispo de Pianceza tinha preparado para defende-los . E a participação do missionário será eficaz e chegará tão perto das raízes do mal que o governo se sentirá obrigado a sair de uma culposa ineficiência e a mudar, finalmente, uma lei errada.
Padre Maldotti até fez 2 travessias com os emigrantes para verificar as condições da viagem. Ao retornar , formulou as autoridades algumas propostas, que em parte, serão acolhida pela nova lei da emigração.
Fez também duas longas viagens à América do Sul para ver pessoalmente as condições de vida dos emigrados.
Realizou tais viagens incógnito, vestido de explorador, acompanhado por um médico. Visitou numerosos centros agrícolas do Brasil e esteve nas capitais do Uruguai e da Argentina.  Percorreu 6000 Km de trem e 500 a cavalo, pregando , observando, anotando . E como os jornalistas o perseguiam para conseguir uma entrevista e utilizavam o telegrafo para seguir seus passos, viu-se obrigado a se vestir de brigante. Um velho amigo encontrado 20 anos depois em plena floresta, deixou-lhe uma foto como recordação daquele maravilhoso disfarce
No final de sua viagem, padre Maldotti escreveu, para seus bispo e para  as autoridades italianas, uma documentação rica em observações e propostas. Entre as propostas, havia a criação junto aos consulados, de um funcionário com atribuições especiais, encarregado da tutela e da assistência dos italianos no exterior. Também essa  proposta será acolhida pela primeira lei sobre a emigração aprovada pelo parlamento italia

Observação; Embora esta postagem, não tenha Bedin's, trata-se da história da emigração italiana para o Brasil e aí estão também os Bedin's.



Nenhum comentário:

Postar um comentário